terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O Encardido é High Tech!


Dia desses, esticado no sofá e zapeando em busca de algo que me prendesse a atenção – quando fico assim é quase impossível que algo na TV me agrade -, deparei-me com um programa da Rede Canção Nova onde era exibida uma pregação do amado e já "liberto" Pe Léo. Esta já se encontrava no meio, mas o que vi e ouvi mexeu com meus músculos, veias, membros, coração, cérebro e alma. Não sei ao certo o nome da pregação, mas durante o prazo que estive na frente da telinha, ele citou 3 dos tidos como pecados originais pela igreja católica: avareza, gula e luxúria. Nomeando o "mal" e o "mau" ( leia-se satanás, belzebu, lúcifer, capeta, demônio ou o que você quiser ) como encardido – sempre puxando o r de mineiro do interior – aquele ser me fez enxergar pequenas coisas – porque as grandes eu vejo – que serviram para reforçar alguns valores e, principalmente, para me deixar mais antenado.
Não sou extremamente avesso à tecnologia – computadores, internet, softwares, telas assim e assado, wireless, hardwares, etc – mas não acompanho muito bem ou como gostaria de acompanhar todas as mudanças e atualizações decorrentes desse universo. Porém, o que assisti naquela pregação me fez despertar para algo que, infelizmente, tenho que admitir: o encardido é mais high tech do que eu. Claro que com finalidades bem diferentes, o ser das trevas utiliza de mecanismos sofisticados para continuar com seus planos funestos. Ele apenas está se atualizando e difundindo sua milenar cultura. Então comecei a analisar dois dos 3 termos citados pelo Pe Léo: avareza e gula. Nós adoramos apontar o dedo para as pessoas que pecam por vários motivos, principalmente por serem usuárias de álcool, maconha, cigarros, cocaína, anfetaminas, crack e etc. Fazemos isso por vários motivos: para difamar, para mantê-los afastados dos sóbrios e saudáveis ( lembra-se do campo dos leprosos? ) para identificá-los ( "A Letra Escarlate" é um filme lindo ) e, muito pouco, para ajudá-los. Esses tipos de pecado não são bem vistos por nós que, tentando ser diferentes, buscamos formas que são aceitas dentro da sociedade ( que nada mais é do que o resultado de nossas ações ). Mas, que tipo de pecado é socialmente aceito? Uai, vários! É isso mesmo! Explico já: às vezes nem nunca usamos as drogas acima citadas, mas que, quando saímos "às compras" no intervalo para almoço, que é ótimo para praticarmos esse tipo de fast food, principalmente nas lojas em promoção, retornamos ao trabalho tão esfuziantes que parecemos ter cheirado umas 10 carreiras de pó! E quando compramos nossos reluzentes automóveis, com acessórios cada vez mais poderosos e chamativos? Entramos em êxtase, principalmente na hora de mostrar aos amigos ou quando alguém comenta alguma coisa. Quantos de nós saíram do país em busca de "um futuro melhor", de uma vida mais confortável, e deixaram os filhos para trás, sendo cuidados pelos avós, tios? Quando alguém constrói casas, prédios, cria empresas e etc, dizemos "fulano está bem, hein"! E quando vemos um folder de supermercado? A primeira pergunta é "o que está na promoção?". Fazemos isso até sem precisar, mas queremos ver o que tem lá.
Talvez você esteja achando loucura o que escrevo ou se perguntando "o que esse cara está tentando explicar?". Dá até a impressão que tenho uma visão ultrapassada, de país de terceiro mundo. Não é isso. Eu apenas questiono os motivos pelos quais fazemos tudo isso. O "encardido" sabe a forma que agimos diante dos vícios ilícitos, dos vícios condenados. É uma situação já experimentada. Ainda não conseguimos mudar nossa concepção. Então, ele nos pega através dos vícios socialmente aceitos: comer muito, comprar muito, "ganhar" muito dinheiro, construir muito. Assim, como os usuários de drogas, nos viciamos em coisas que entendemos ser normais. O ato de usar drogas tem o mesmo fim que o ato de comprar, de consumir, de construir excessivamente: suprir necessidades internas, emoções com as quais ainda não aprendemos a nos relacionar. Questões existenciais e espirituais. Quantos são os filhos daqueles que saíram do país que foram trocados por uma vida confortável? E isso se aplica também para nós que continuamos nossa rotina tupiniquim. Estudamos muito, trabalhamos muito, só para acompanhar as mudanças que são cada vez mais rápidas. E o encardido também sabe disso. Porque ele gastaria energia com algo que não gostamos, que criticamos e às vezes até abominamos? Toda a força dele está voltada para aquilo que temos como NORMAL e NECESSÁRIO! Nossos aparelhos tecnológicos, sejam eles residenciais ou utilitários do trabalho estão cada vez mais modernos, mais facilitadores do dia a dia. E o encardido sabe disso também. Ele acompanha todas os lançamentos dos novos modelos e das novas marcas. Isso se não for ele o criador de tais. Buscamos, ao longe, acessar uma realidade totalmente virtual, e esquecemos que a plena realidade se encontra bem próximo, dentro da gente.
O nosso comportamento de consumo, que os grandes especialistas insistem em pesquisar para conseguirem vender mais, nada mais é do que o reflexo do que conseguimos fazer conosco. É verdade! Conseguimos! Autorizamos a todas as emissoras de TV e internet a entrarem em nossas casas e nos ensinarem a consumir, a nos "provarem" que "precisamos" ou disto ou daquilo. É tudo culpa nossa! E, mais uma vez, o encardido sabe disso.
Diante desse universo de informações cada vez mais rápidas perdemos o controle de nossas vidas e algumas de nossas principais características, entre elas o "querer". Para nós, seres humanos, o desejo, a necessidade e a vontade ( um abraço aos "antigos" Titãs) são sentimentos adaptáveis a qualquer situação. Nossas necessidades mudaram a configuração.
Como faríamos então para acompanhar o ritmo mundial sem sermos engolidos pela onda do consumismo? Respondo: valorizar mais cada instante em que estamos com os nossos, aproximar o máximo possível das pessoas que temos, buscar compreender nossas "reais" necessidades e não aceitar as possíveis e virtuais demandas impostas por um sistema que se torna, a cada dia, mais cruel, mais competitivo e desleal. E acima de tudo, de qualquer "suspeita", perguntarmos para nós mesmos: o que estou fazendo aqui nesse planeta? Qual é o grande motivo da minha passagem por aqui?

                                                                                       Mentequente